A principal razão da cura é o amor

O mês passado fiquei doente. De repente, estava com tosse, febre e uma pressão enorme na cabeça. Gripe! Já não me lembrava como era, estar na cama sem forças para me levantar. Ainda por cima esta gripe teimou em ficar comigo durante umas semanas. 

Parecia má sorte. Mas na verdade mostrou ser o oposto. Os dias que passei engripada foram dias em que tive que aceitar que não consegui controlar nada: a natureza mostrou-se mais forte do que a minha vontade de me sentir bem. Aceitando a situação, não restava mais nada do que ouvir o corpo.

E o corpo falou. Vieram memórias, padrões começaram a revelar-se. E vieram os insights - a doença e os dias febris trouxeram uma cura que ultrapassou a dimensão física. Temas que há anos foram como sombras na paisagem interior, ficaram mais claras e pacíficas. Entendi a dinâmica de certos relacionamentos, vi os obstáculos noutros. Fiquei melhor depois de encarar e assumir a minha parte da responsabilidade de certas situações problemáticas.

E lembrei me de um texto que escrevi há uns dez anos para este blog. Hoje quero partilhar este texto novamente convosco.

Quando estamos perante um problema na nossa vida - seja este de natureza emocional, psicológico ou físico - apresenta-se uma escolha entre duas opções: ficamos de braços cruzados, deixando que seja o sofrimento a mandar na nossa vida; ou em alternativa, procuramos uma solução para ultrapassar o sofrimento?

Parece simples: é uma escolha entre sofrer ou não sofrer, e parece óbvio que qualquer ser humano escolhe o não-sofrimento!

 Acontece que nem sempre é tão linear quanto isso. Imagina-se, por exemplo, um doente com uma doença crónica - que se pode manifestar ao nível físico ou mental. Pode parecer uma fatalidade, ter uma doença desta natureza - aconteceu. A linguagem utilizada deixa transparecer a fatalidade: a pessoa sofre de tal doença.

Podemos escolher o não-sofrimento, entregando-nos nas mãos de médicos sábios e experientes, esperando alivio e cura. Mas esta parte só diz respeito ao sofrimento físico. No entanto, desde há muito os curandeiros e médicos sabem que há um outro lado em cada doença que precisa de ser cuidado.

Pitágoras disse que a arte mais divina era a da cura. E se a arte da cura é mais divina, deve ocupar-se da alma bem como do corpo; porque nenhuma criatura pode ser sã equanto a parte mais elevada de si estiver doente. (Apolónio de Tiana,)

Há aspectos em cada doença, a que podemos chamar a parte espiritual: tem a ver com o estado da nossa alma. A noção que em todas as doenças há um componente psicossomático, é hoje em dia largamente aceite, e existe desde que há memória. Conhecemos, por exemplo, o conceito do karma, em que tudo o que nos acontece, é fruto das nossas acções, atitudes, gestos e pensamentos no passado. Mas também a tradição judaica-cristã é familiar com a noção, sendo que esta adoptou uma visão diferente, como atestam os primeiros versos de João, 9:

E passando Jesus, viu um homem cego de nascença.
Perguntaram-lhe os seus discípulos: Rabi, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?
Os discípulos ligam a noção de doença e deficiência ao pecado, remetendo a culpa da cegueira para o próprio doente.
Jesus responde, eliminando a noção da culpa, mas introduzindo outro conceito:
Nem ele pecou nem seus pais; mas foi para que nele se manifestem as obras de Deus.(João 9: 1-3)

É feito referência ao componente espiritual da doença, que serve um propósito que vai além da pessoa que tem a doença: é uma oportunidade para quem tem a doença, de reconhecer e recuperar o Divino em si...

Isso sim, é uma escolha que precisamos de fazer. Escolhemos abrir mão da dor da alma? 

Quando a alma está ferida - revivendo traumas do passado, ou quando está insegura ou  desequilibrada, com sentimentos de inferioridade, com raiva, inveja ou revolta, quando há medo ou culpa - a pessoa precisa de escolher também curar a sua alma. É preciso desejar profundamente que a alma volta a ser inteira, de ter vontade de voltar a sentir a alegria da vida e a gratidão por ser quem é. Essa vontade pode dar a força de libertar o passado, desapegar da dor da alma.


Mesmo se o corpo físico traz uma doença que dá dores, a alma sempre tem cura.


A principal razão da cura é o amor (Paracelso). Penso que podemos acrescentar: o principal resultado da cura, é o amor.

É o amor que é a cura. Se a alma encontra, dentro de si, novamente o amor, encontra a cura. Encontra a razão de ser de tudo que lhe aconteceu, inclusivo a doença. Tudo serve para dar a pessoa a oportunidade de escolher o amor.

E se a cura é o amor, o caminho é o desapego. Deixar ir o passado, não agarrar mais a imagem que construimos de nós no passado, e que construimos com base da nossa reacção à dor... E começar a sentir que é agora possível deixar surgir uma nova sensação, baseada na compreensão que tudo faz sentido quando há amor no coração. Amor-próprio: a sensação que a nossa vida faz sentido, que temos um valor intrínsica que é a nossa existência. Amor pela vida: a noção que estamos todos ligados, que não há barreiras entre o eu e o outro. O caminho em conjunto serve para sermos um espelho uns para os outros, e mostrar que o valor, a luz e o amor existem em cada ser humano.


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